O MISTERIO DAS BAQUETAS QUEBRADAS
(25/12/13)
Meio século já passara, e o mistério persistia.
A primeira banda, ainda tinha pouco mais de 10 anos.
Banda de garagem, gracinha para os pais, desespero de vizinhos.
O nome escolhido foi Red Snake.
Mal imaginava que aquele bando de moleques do Grajaú caminharia junto por tanto Rock.
O tal mistério datava daquela época.
Vez por outra as baquetas da bateria apareciam quebradas, quase sempre depois de alguns dias sem tocar.
Se alguém da casa sabia de algo, nada dizia.
A garagem era santuário e inferno ao mesmo tempo.
Pisar ali era ato de devoção e temeridade.
No fundo, achavam que era coisa de juventude transviada, e que passaria com o tempo.
Ou com o aparecimento dos namoros mais sérios, ou com a chegada da fase adulta.
Só que elas vieram e trouxeram mais estímulo e mais rock.
Enfim, namoradas, drogas e rock'n roll.
Na garagem, onde o mistério ainda pairava no ar.
E claro que era um misteriozinho sem importância.
Mas de vez em quando ele tamborilava na cabeça.
Até mesmo quando a nova banda foi formada, outro nome, outras festas.
Outras namoradas, mas sem trocar a de fé.
The Shades.
O nome, quando ainda hoje falado, lhe traz arrepios que procura dissimular.
A banda andou por aí
A ponte Grajaú - Paty do Alferes passou a fazer parte da vida.
Assim como os amigos que acompanhavam, tietes, por onde ela fosse.
E, vez por outra, la vinha o tal mistério.
Quando eu conheci a família, a Banda era "de Aluguel"
Aluguei, peguei, pra mim, o que a Banda tinha de melhor.
A irmã idólatra do baterista, a maior de suas adoradoras.
Por anos a fio percebi o nome do irmão brilhar em seus olhos.
O maior, o engraçado, o artesão das bolsas de couro e da madeira balsa.
O fotógrafo dos pássaros nos fios de Saquarema.
O músico de tantas garagens e bailes.
Acompanhei o enbranquecimento dos cabelos.
Nada que afastasse do rock aqueles Senhores.
E nada que resolvesse o caso com o passar do tempo.
Hoje é dia de Natal
Paira no ar uma profusão de sentimentos.
Falam, ainda, sobre o Mistério do Natal.
Todos os anos o almoço aqui de casa recebe a visita da familia dele.
Minha sogra aguarda ansiosa para apresentar o bacalhau.
Não pode faltar cerveja, tradição paterna.
Ano passado já foi diferente.
Aos poucos novas famílias se formam, novos almoços se fazem.
O bacalhau aguarda, imponente, mas há um mistério
Ele virá?
Veio só.
Não trouxe a Banda nem seu bando.
Chegou para o café e não almoçou.
O bacalhau e as rabanadas, que sempre acabavam, vão pro almoço de um amanhã.
As cervejas congelaram.
Mas o café da manhã foi especial.
Por tantos anos guardados, o segredo se desfez.
Talvez um pouco triste, pela passagem fugaz do irmão.
Ainda muito tiete, apologia diária dos dons do ídolo.
Fotógrafa amadora,
Ceramista de finas mãos.
E estas conheco bem,
Olhs embaçados, fixos, vidrados,
Um gole de café e uma revelação.
"Eu sempre quiz tocar bateria."